Sistema Eletrónico de Administração de Conferências, Vol II (2017)

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Modos outros de habitar as cidades
Leon Dutra Paiva

Última alteração: 2017-09-16

Resumo


É na cidade onde o socius se manifesta, que posturas definem os modos como habitamos este lugar chamado cidade. Queremos descobrir modos outros, que não o “nosso”, de habitar, de experimentar. Queremos transitar pelas singularidades, romper uma ordem. Queremos uma postura inadequada. Ao trabalhar o conceito de flâneur, Baudelaire investiga o caminhar pela cidade. O flâneur experiencia a cidade. Identificamos uma tentativa do Estado de (re)capturar um sujeito em situação de rua, querendo impor um modo ideal de habitar a urbe. Com isso, objetivamos investigar os modos de habitar as cidades através do conceito de flâneur. Isto foi possível através de um projeto de extensão, o “Laboratório de Práticas Instituintes Deflagradoras de Arranjos Reterritorializantes (LAPIDAR)”. Com o projeto, realizamos reuniões semanais de duas horas para problematizarmos o sujeito em situação de rua e conceitos trabalhados. Também trocamos experiências de campo, nas quais experimentamos a cidade, observando estes sujeitos, investigando seus modos e suas moradas e também a forma como o bom senso, ou o senso comum, se relaciona com a pesquisa. Essa troca mostrou o que conceituamos como a Sociedade do Espetáculo. Com a expansão do mercado e a necessidade constante de adquirir novos consumidores, tantos as grandes quantos as pequenas cidades sucumbiram ao espetáculo. A moda é algo característico deste processo. O espetáculo cria uma realidade de falta, a moda vem para preencher este vazio. O espetáculo transformou tudo em mercadoria. Uma espécie de organismo mecânico. A sociedade vive uma liquidez das relações, na perspectiva de uma propriedade que assume diversas formas e flui como um rio. Neste mundo líquido, a segurança é a velocidade. Existe uma casca fina que separa o sujeito dos objetos velados. A velocidade permite o não desvelamento. Produz sujeitos ocupados, atarefados, trabalhadores e consumidores. Como define Baudelaire (1996), "Narcisos da imbecilidade, contemplem a multidão como um rio que lhes devolve a imagem. Na verdade, existem bem mais para o prazer do observador do que para o próprio prazer" (p.61). Não faltam recursos, que pelo preço certo, possam ser comprados. É neste ponto onde há o flâneur. Percebemos que é preciso atravessar este rio, não o contemplá-lo. Fugir das capturas e produzir modos outros de experiências. Paradoxalmente, há um racionalismo absoluto. O que não é, ou o que não pode ser nomeado é tido como algo estranho. No andar pelas cidades, o espectador enxerga sua imagem e semelhança. É incapaz de identificar modos outros que não os seus, está capturado. Já o flâneur, foge dessa captura. Os sujeitos em situação de rua são extremamente estranhos para o racionalismo espetacular. Habitando as cidades em modos distintos da ordem social, são considerados inexistentes, são ninguém, são fracassados. Para dar conta, os mecanismos de poder utilizam de aparelhos para (re)capturá-los. O NINGUÉM, por direito, habita as cidades do modo que lhe convém. A captura social molda a forma como percebemos a existência, trazendo uma ordem no discurso que molda a forma como compreendemos certos conceitos. Questões como a segurança, a família, a habitação, são conceitos que no senso comum remetem a modos produzidos de forma hierarquizada, conclui-se que, automaticamente, são excluídos modos que não foram racionalizados. Outra forma de analisarmos, de forma crítica, é saber que esses conceitos podem ser incorporados de diversas formas pelos sujeitos que afirmam suas existências. Observando que o NINGUÉM afirma seu modo, ele não está fora de controle. É o que Nietzsche questiona sobre os valores do homem na primeira dissertação de “Para a genealogia da Moral”, afirmando que nada é bom ou mau em si, são as relações que os homens – em cada circunstância – produzem que geram efeitos bons ou ruins. Mostra que o ideal é uma polêmica. O flâneur percebe um forte, no sentido nietzschiano. Os NINGUÉNS, afirmam suas potências em modos singulares de habitar as cidades. Estes modos rompem com a ordem social. O modo como habitam as cidades desvela modos outros que fogem de uma captura que trata a priori a existência e o que há nela. Entre becos e ruas, dias e noites, passando por locais aterrorizados pelas mídias, percebem uma realidade que é não a “nossa”. Aqui se tornam banais os nossos medos e inseguranças. Seria um NINGUÉM livre? Quando o espectador diz algo sobre a moradia (sua casa, seu apartamento, sua forma de habitar as cidades) está reproduzindo uma racionalização mediada pela captura que está submetido. Quando um NINGUÉM afirma sua morada na rua, está exatamente rompendo com esta ordem. Em seu caminhar, possibilita criar e desenvolver novas experiências nas cidades. Quais modos outros surgem dessas relações?


Palavras-chave


cidades; modos outros; psicologia social; flaneur