Sistema Eletrónico de Administração de Conferências, Vol IV (2019)

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UMA ANÁLISE CRÍTICA DO TRABALHO INTERMITENTE: PRECARIZAÇÃO E OFENSA À FUNÇÃO SOCIAL DO TRABALHO
Aline Carneiro Magalhães Carvalhido, João Carlos Silveira

Última alteração: 2019-10-16

Resumo


O Direito do Trabalho nasceu da luta dos trabalhadores por proteção e melhores condições de trabalho. O princípio tuitivo é a base das normas laborais, objetivando retificar juridicamente a desigualdade fática existente entre empregado e empregador.

As normas laborais, entretanto, sempre foram objeto de críticas por parcela da classe empresarial que atribuía ao protecionismo legal uma série de prejuízos à atividade econômica, inclusive no que diz respeito à geração e manutenção de empregos.

A realidade, entretanto, confirmou a disparidade entre capital e trabalho, fato que justifica a existência do Direito do Trabalho como instrumento de melhoria da condição social do trabalhador e, em última analise, de promoção da dignidade do obreiro.

Em 11 de novembro de 2017, entrou em vigor a Lei nº 13.467/17, promotora da denominada reforma trabalhista, trazendo inúmeras alterações à CLT ao argumento de adaptá-la à realidade econômica e criar empregos. Dentre as várias alterações trazidas destacamos a nova modalidade de contrato de trabalho, qual seja, o intermitente.

Nessa modalidade de labor, o empregado exerce atividade conforme a necessidade da empresa, independente do seu ramo, podendo ser convocado para trabalhar por horas, dias, meses ou de forma eventual, fazendo jus ao término do serviço aos direitos trabalhistas proporcionais ao período trabalhado, não lhe sendo garantido qualquer valor mínimo pelo labor ou pelo tempo à espera de ser convocado.

A despeito de ainda não ser possível identificar concretamente os efeitos dessa nova modalidade de trabalho, considerando o pouco tempo de vigor da nova lei, acredita-se que ela poderá trazer deletérios impactos à vida sócio-econômica dos empregados, a começar pelo comprometimento das suas finanças e da sua qualidade de vida por causa da falta de garantia de um valor mínimo mensal capaz de prover as suas necessidades essenciais uma vez que não lhe é garantido o trabalho.

Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo geral demonstrar, por meio do método dedutivo de abordagem e de pesquisa bibliográfica e documental, buscando, inclusive, amparo na legislação de outros países, que o contrato de trabalho intermitente da maneira como foi estipulado na citada lei implica precarização e fere o princípio da função social do trabalho, sendo um retrocesso social pela supressão de direitos fundamentais constitucionalmente garantidos.

Ao analisar os arts. 443 e 452-A da CLT, verificou-se que a maneira como esse contrato foi normatizado implica precarização e fere a função social do trabalho pela supressão de diversos direitos trabalhistas garantidos e efetivados pela CF/88.

O contrato de trabalho intermitente não garante ao trabalhador serviço, tampouco salário, em razão da imprevisibilidade da convocação pelo empregador. Além disso, no tocante às férias, o trabalhador não terá remuneração e o acréscimo de 1/3 à época do seu gozo, pois já o terá recebido proporcionalmente ao término da prestação de cada serviço, contrariando a CF/88.

Na nova modalidade de labor o trabalhador intermitente assumirá em parte o risco da atividade empresária pois ele só trabalhará se houver demanda, o que afronta o art. 2º da CLT que atribui ao empregador o princípio da alteridade.

Da forma em que foi normatizado o contrato de trabalho intermitente, verificou-se que não foram resguardados os princípios norteadores do Direito do Trabalho, tais como o princípio da proteção, o da função social do trabalho, o da continuidade da relação de emprego, o da condição mais favorável ao trabalhador, dentre outros, demonstrando ser uma forma contratual precária que carece de revisão e adequação aos preceitos basilares juslaborais e constitucionais.

É preciso incrementar o debate sobre esse novo contrato, aperfeiçoar o texto legal a seu respeito, inclusive aprendendo com o direito de outros países que garantem um valor mínimo ao obreiro enquanto espera ser chamado e garantir a manutenção dos direitos fundamentais sociais dos obreiros, de modo que o contrato intermitente possa melhorar a empregabilidade e trazer mais trabalhadores para o manto protetivo juslaboral.

Neste contexto, é importante reiterar que é preciso aperfeiçoar o texto legal à luz dos direitos fundamentais sociais elencados na Constituição Federal, bem como dos princípios do valor social do trabalho e da proteção, garantindo ao empregado intermitente os direitos trabalhistas essenciais, a exemplo de jornada mínima de trabalho, compensação pecuniária em caso de inatividade, férias remuneradas com o acréscimo de 1/3 e estabilidade nos casos legais para que o contrato de trabalho intermitente realmente cumpra a sua função social à luz da dignidade da pessoa humana e seja capaz de proporcionar melhores condições de vida ao trabalhador.

Palavras-chave: Trabalho intermitente. Crítica. Precarização. Função social do trabalho.